CARLOS LARANJEIRA faz um passeio pelo mundo das artes cinematográficas que por esta terra teve importância na difusão da cultura e das visões do cinema mundial. O Cine Lourdes foi um importante ponto de encontro que até hoje, muitos maragogipanos lembram e sentem saudades. Atualmente, a Prefeitura Municipal inaugurou um Centro de Saúde (Foto ao lado) no local onde o Cine Lourdes permaneceu por um bom tempo, confira o texto do escritor:
por: Carlos Laranjeiras
Bons tempos aqueles do Cine Lourdes, de propriedade de Mário Carvalho. Entre o Bar de Ariston e o Saboeiro, aproximou as pessoas, promoveu amizades e nos anos 50 e 60 infundiu na cabeça de meninos como eu pensamentos de que a arte pode comunicar alegria, tristeza, comover, impressionar e narrar histórias.
No Cine Lourdes, testemunhei o gênio de Charles Chaplin mudo, só com gestos, mostrar como se faz uma graça tão perfeita que os barulhentos programas de televisão de hoje, com mais de 100 participantes, não conseguem imitá-lo nem de longe. Vi John Wayne, Gary Cooper e Gregório Peck transportarem os horrores da II Guerra.
Com esses dois olhinhos que Deus me deu, percebi pela visão Sophia Loren, com sua beleza exótica, apresentar o drama de uma mulher cujo marido não retorna com as tropas em Os Girassóis da Rússia. Destemida, ela vai a esse país procurá-lo e o encontra. O filme me mostrou a virtude da persistência, que acaba o desânimo e o medo.
Assisti Brigitte Bardot, Kirk Douglas, Johnny Weissmuller, Burt Lancaster, Randolph Scott, Roy Rogers, Charles Starret com metade do rosto coberto pelo lenço negro e chanchadas com Ankito, Grande Otelo, Oscarito e Zé Trindade, baiano de Salvador, mas dizia em filmes ter nascido em Maragogipe.
E os documentários com os compactos de jogos de futebol do Rio de Janeiro, exibidos antes dos filmes, quem não lembra? No Cine Lourdes tive contato com a obra de Plínio Marcos, que eu viria conhecer em Santo André e José Mojica Marins, o Zé do Caixão, quem Glauber Rocha considerou um dos gênios do cinema. Também vi Ângela Maria e Waldick Soriano.
Se existe uma família que preciso pedir desculpas em público pelo que fiz é a de Mário Carvalho, um homem baixo, pele morena, magro, já de idade, mas ágil. Em Maragogipe, passei todo tipo de decepções e humilhações porque a maioria das pessoas não me entendia, outras me entenderam e perdoaram, então não tenho vergonha em dizer que aos 11, 12 anos, entrava no Cine Lourdes por baixo da grade no lado da Praça do Saboeiro ou passava na confusão que se formava na entrada sem pagar. Mário chamava o delegado Bortolomeu Americano e o soldado PM Góes que me retiravam do cinema. Tanto Americano quanto Góes tornaram-se amigos quando cresci. Devo muito também a Leleco, filho de Osvaldino Malaquias, fabricante de doces, de quem papai, Bartolomeu Laranjeira, era cliente. Leleco cansou de pagar minhas entradas.
Essa experiência me ensinou muito, além de me despertar o gosto pela arte inclusive pela arte de escrever.
Carlos Laranjeira é jornalista.
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